Depois de política, o tema
mais discutido por especialistas de redes sociais por essas bandas é a
Educação. Tema caro a todos nós – do meio ou não – ele foi assunto recorrente
nos últimos meses tanto pelas confusões promovidas na curtíssima gestão Velez,
quanto pela queda de braços promovida pelo atual ministro, Abraham Weintraub, e
profissionais da área que se sentem ameaçados por suas medidas e declarações,
como no caso do contingenciamento dos gastos das universidades federais e as
acusações do ministro quanto à doutrinação de professores e aliciamento de
alunos.
Bem, não vou me ater a bate
boca de Clotilde aqui, nem levantar bandeira a favor de qualquer lado, o que
pretendo mostrar é que, apesar de muito falado, poucos tem a real
compreensão de como é a educação no Brasil, mesmo os profissionais da área não
se dão ao trabalho de pesquisar e a tentar entender de maneira pragmática o
problema e, na esmagadora maioria das vezes, ficam repetindo bordões e frases
feitas promovidas por políticos oportunistas ou sindicatos, que no mundo real
mais atrapalham do que ajudam. E mesmo esses profissionais do ensino que não procuram
olhar de forma racional o drama educacional brasileiro, não o fazem nem é por canalhice,
mas por terem sido malformados e também condicionados para acreditarem e
reproduzirem ad eternum esses clichês.
Uma prova disso foram os
argumentos usados nas manifestações que vimos no último mês onde professores e
alunos – não farei juízo de valor, nem falarei nada sobre ter havido ou não
coação dos alunos por parte dos professores, não é o intuito desse artigo – dentre
eles, o clichê da falta de investimentos na área. Só que hoje, por exemplo, o
país investe 6% do PIB – parece pouco, mas é mais do que o Chile e o Uruguai,
os melhores sistemas de ensino da América Latina – e tem uma meta de investir 10% até 2024 (mesmo patamar dos países da OCDE). Isto é, como poderá ser visto
logo a seguir, investir mais não significa melhores resultados.
Pois bem, as mesmas pessoas
que apregoam que faltam recursos na área, não fazem a menor ideia
de como ou se há qualquer relação entre gastos e produtividade, também não fazem
a menor ideia dos reais números ou qualquer informação e não se dão conta nem
de que eles próprios, professores, também foram vítimas desse processo falido e que
virou fábrica de analfabetos funcionais. Abaixo enumerarei alguns números que
servem para mostrar a quantas anda a educação e que servirá para se entender
até mesmo porque os professores por aqui são como são.
O problema educacional já
começa na formação do profissional de ensino e culmina nos resultados que
mostrarei em breve, criando um círculo vicioso de baixa qualidade de ensino,
que leva a um profissional mal preparado, que leva uma baixa qualidade e assim
por diante. Dois dados iniciais já dão a tônica de como é formado um professor
nas melhores universidades do Brasil:
-
Os cursos de licenciatura por aqui – vamos ficar
nos principais: Letras e Matemática – dedicam apenas de 5% a 11% da carga
horária para disciplinas didáticas específicas, em cursos de pedagogia o
percentual ainda é menor, 4%, ficando o restante da grade dedicado a estudos teóricos
diversos como sociologia ou história da educação (esses ficam em torno de 22%
as obrigatórias e 20% as optativas);
- Metade dos professores em atividade no Brasil
não escolheram essa profissão, ou seja, um em cada dois professores queria
fazer outra coisa. Pensem um pouco: como você vai trabalhar com competência e
dedicação se não é necessariamente aquilo que você quer fazer?
Os dois dados acima não
foram tirados do éter, eles fazem parte de uma pesquisa patrocinada pela UNESCO
e feita em 2009. Essa pesquisa foi conduzida por Bernadete Gatti, que desde os
anos 1980 estuda a situação do docente no país. Esse estudo revelou também mais
um dado: os cursos de licenciatura, por serem os menos concorridos, acabam
atraindo os alunos com os menores rendimentos escolares já que o nível de exigência
para passar é menor (a relação candidato/vaga em Matemática na Fuvest, por
exemplo é de 3 para 1).
Pois bem, o que isso serve
para ilustrar, vejamos: a profissão que, segundo os memes forma outras profissões,
é a que menos atrai cabeças pensantes. Atraindo somente os menos capacitados e
ainda tendo uma formação precária, o que temos aqui é uma roda viva de alunos malformados
que vão para as salas de aula e formam mal outros alunos, que por sua vez, viram
novos professores e entramos num ciclo sem fim. E esses professores
despreparados ainda são alvos fáceis de teorias relativistas e coletivistas,
como a Escola de Frankfurt ou a pedagogia do oprimido. A realidade é que,
quando o ministro fala sobre doutrinação nas academias e professores vêm putos
alegando que não foram, na real, eles nem se dão conta do que lhes foi feito, são fruto de 3, 4, gerações de professores imersas nessas teorias,
para eles – professores – essa é a realidade, é o mundo a que foram
apresentados desde sempre.
E onde isso nos leva? Aos números
sobre educação que listarei abaixo. Hoje, temos no Brasil:
- 29% de analfabetos funcionais na faixa entre
15 e 64 anos;
- 21% de analfabetos rudimentares na mesma
faixa;
- 8% de analfabetos absolutos (25% desse número
são maiores de 65 anos);
- 41% dos brasileiros na faixa de 25 anos não
concluíram o ensino médio (no Chile e na Coreia do Sul, por exemplo, esse
número é de 14% e de 7,5%, respectivamente);
- 35% dos estudantes reprovaram pelo menos uma
vez durante a sua vida escolar (a média da OCDE é de 15%);
- 26% dos alunos abandonam a escola.
Esses números, somados aos
baixos salários e os problemas de saúde relacionados ao ofício docente (66% dos
professores se afastam por razões médicas, sendo 87% relacionadas ao trabalho
em sala de aula), dão a tônica do que é a educação no Brasil. Isso é uma
observação racional, a partir da coleta de dados reais e que passa ao largo dos
clichês do tema. Infelizmente, aqueles que deveriam olhar de forma clara esses
números e fazer algo, os que estão na ponta de lança – professores e gestores
educacionais – na maioria das vezes aumentam mais ainda esse drama, não intencionalmente,
mas por serem também vítimas desse sistema perverso que destrói a inteligência do
país e impede nosso desenvolvimento.
E quando vemos um professor
indo para as ruas protestar pedindo mais intervenção do Estado, quando vemos um
ministro da Educação com discursos simplistas, quando percebemos a cegueira dos
profissionais de ensino sobre a nossa rotina, fica claro o quanto poucos têm a
real noção do que está acontecendo e que, infelizmente, esse nó ainda demorará
muito a desatar.
Fontes:
ALBERTAL, Adriana L. Os resultados no Pisa: reflexões sobre a
educação no nosso país. Direcional Escolas: A revista do gestor escolar,
São Paulo, 19 set. 2018. Disponível em: <
https://direcionalescolas.com.br/os-resultados-do-pisa-reflexoes-sobre-a-educacao-no-nosso-pais/>.
Acesso em: 14 mar. 2019.
BARROS, Daniel. País mal-educado: por que se aprende tão
pouco nas escolas brasileiras? Rio de Janeiro: Record, 2018.
MELANDA, Francine Nesello. Violência física contra professores no espaço
escolar: análise por
modelos de equações estruturais. Trabalho de pós-graduação em Saúde Coletiva.
Universidade Estatual de Londrina, Paraná, 2017, 12 p.
PALHARES e DIÓGENES, Isabela e
Juliana. Três em cada dez são analfabetos
funcionais no país. Estadão, São Paulo, 06 ago. 2018. Disponível em:
<ttps://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,tres-em-cada-10-sao-analfabetos-funcionais-no-pais,70002432924>.
Acesso em: 14 mar. 2019.
PIERI, Renan. Retratos da educação no Brasil. São
Paulo: INSPER, 2018.
TEIXEIRA, Larissa. Ansiedade, estresse, dores
de cabeça e insônia estão entre os principais problemas que afetam educadores,
segundo estudo realizado pela NOVA ESCOLA.
Nova Escola. São Paulo, 16 ago. 2018.
Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/12302/pesquisa-indica-que-66-dos-professores-ja-precisaram-se-afastar-devido-a-problemas-de-saude>. Acesso em: 14 mar. 2019.
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