Millor Fernandes:


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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A "Democracia Corinthiana" um exemplo de autogestão anarquista

Presto minha homenagem a Sócrates falando de seu maior feito no futebol. Maior que qualquer título que poderia ter vencido com o corinthians ou maior até que o futebol e a magia da seleção de 82.

Falo da intitulada "Democracia Corinthiana" que nada mais era que um sistema de autogestão anarquista.

Autogestão
é quando um organismo é administrado pelos seus participantes em regime de democracia direta. Em autogestão, não há a figura do patrão, mas todos os empregados participam das decisões administrativas em igualdade de condições. Em geral, os trabalhadores são os proprietários da empresa autogestionada.

Os conceitos de autogestão costumam variar de acordo com a posição política ou social de determinado grupo. O conceito anarquista de autogestão se caracteriza por eliminar a hierarquia e os mecanismos capitalistas de organização envolvidos.

E foi exatamente isso que os corintianos fizeram. Jogadores, comissão técnica e diretoria decidiam tudo no voto. As pautas eram as mais variadas: contratações, demissões, escalação, local da concentração, entre outras. Todos os votos tinham peso igual, dos jogadores, dos funcionários, do presidente.

Historico

O movimento existiu graças ao encontro das pessoas certas no momento propício. A campanha de 1981 foi uma das piores da história. O time terminou na 26ª posição no Brasileiro e, no Paulista, amargou um oitavo lugar que o rebaixou para a segunda divisão do Brasileiro de 1982 - na época, os estaduais determinavam a classificação para o campeonato nacional. Em abril, o clube elegeu Waldemar Pires como presidente, encerrando o reinado de Vicente Matheus

Pires escolheu como diretor de futebol do clube um sociólogo, Adílson Monteiro Alves que primava por ouvir os jogadores. Somando isso a jogadores politizados, como Sócrates e Wladimir, começou uma revolução dentro do Corinthians.

O Corinthians já tinha experimentado uma primeira revolução democrática com o surgimento da Gaviões da Fiel em 1969, que nasceu como forma de combater Waldih Helu, presidente do time e um dos comandantes da Arena o partido da ditadura. Com os métodos do regime perseguiu torcedores com repressão aberta e cacetetes policial. Alguns membros fundadores da Gaviões foram vítimas do regime militar.

Sócrates, Vladimir, Zenon, e o jovem Casagrande, eram os maiores expoentes da Democracia Corinthiana, fruto das célebres greves do ABC, movimento pela anistia, o país começava a respirar novos ares pelas liberdades e um dos maiores times de massa, no estado mais rico do país entra em plena sintonia com este momento, as célebres mensagens nas camisas, ou faixas carregadas na entrada ao gramado pedindo, por exemplo, Diretas já ou Eu quero votar para Presidente, ou ainda o lema do time: “Ganhar ou perder, mas sempre com Democracia” foi revolucionário demais.

O Corinthians foi o primeiro clube a utilizar a camisa com dizeres publicitários. Por iniciativa do publicitário Washington Olivetto (criador do termo 'Democracia Corintiana') o time estampava em suas camisas frases de cunho político, como "diretas-já", "eu quero votar para presidente". Isso no período da ditadura militar, quando os movimentos sociais começavam a se rearticular para a instituição de uma democracia.

- Havia entre os próprios jogadores quem não aprovasse o sistema como o goleiro Leão -

O resultado desse sistema revolucionário foi próspero. O time chegou nas semifinais do campeonato brasileiro daquele ano, e conquistou o campeonato paulista em 1982 e em 1983. Além disso, durante o período de autogestão, o Corinthians quitou todas as suas dívidas, e ainda deixou para o próximo período uma reserva no caixa de US$3.000.000. Um caso raro, já que a maioria dos grandes clubes do Brasil possuem dívidas gigantescas em sua maioria iniciadas ou aumentadas nesse período.

Criação do Clube dos 13 leva Democracia Corinthiana ao fim

A partir de 1984 começa a articulação para criar o Clube dos 13, onde a figura do presidente e sua cadeira no clube eram essenciais para o ingresso. Aliado a isso, o time amargou resultados ruins nas temporadas de 1984 e 85, e principalmente vendo clubes como Flamengo com gestão clássica se destacaram no cenário nacional (o que sabemos que foi um desastre para o clube que soma dívidas colossais até hoje).

A ida de Sócrates para a Fiorentina em 84 também colaborou muito com seu fim.

Logo depois, se consolidaria ainda o futebol moderno vindo da Europa e trazendo meios privados e gerenciais de gestão de clubes. Houve articulação para voltar ao movimento no final dos anos 80, mas agora sem força, face a "nova ordem do futebol mundial" que despontava com a FIFA, UEFA e a Copa do Mundo de 1990.


Esta liderança de Sócrates o levou a ser capitão da maior seleção brasileira de todos os tempos, o time comandado por Telê em 1982, jogava por música, eram craques do 1 ao 11, e tinha pelo menos três gênios no meio de campo: Falcão, Zico (o maior deles) e Sócrates. Os deuses do futebol não permitiram o título mundial, mas jamais esqueceremos os seus feitos.

Sócrates ainda hoje é o 8º maior artilheiro da história do Corinthians com 172 gols, mesmo jogando como ponta de lança. Ele foi o único jogador eleito unânime como um dos 11 de todos os tempos do timão. Foi eleito pela FIFA um dos 100 maiores de todos os tempos.

É quase impossível dissociar a Democracia Corinthiana da imagem de Sócrates, a figura que foi um dos seus mais lúcidos e vibrantes porta-vozes, jamais aceitou as visões autoritárias de técnicos e esquemas do futebol.

Há quem diga que a seleção de 70 de certa forma tinha alguma autogestão. Mas ela se aplicava somente nas decisões táticas em campo onde Zagallo se limitava a convocar os jogadores.

Hoje vemos um Corinthians bem diferente do dos tempos de Sócrates. Vemos um clube aliado da CBF, do poder e de gente como Ricardo Teixeira. Uma pena.

Fontes:
Socrates e a Democracia
Wikipedia: Democracia Corinthiana, Autogestão, Anarquismo

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