Millor Fernandes:


Jornalismo, por princípio, é oposição – oposição a tudo, inclusive à oposição. Ninguém deve ficar acima de qualquer suspeita; para o jornalista, não existem santos.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

A "democracia" do Ativista virtual e as causas de Facebook

Por: Rafael Andreazza Daros



"Democracia e Causas do Face"

O filósofo Luiz Felipe Pondé, em uma de suas críticas à juventude de hoje que “luta” por um “mundo melhor”, disse que normalmente são jovens que acham que vão mudar o mundo, mas não querem arrumar o quarto. Claro, há uma certa dose de ironia, mas a questão é válida. As “causas do face” atraem muita gente justamente porque seu custo de investimento é praticamente zero.

Por exemplo, se alguém compartilha algo no estilo “salvem as baleias” (considerando que a pessoa realmente acredite nessa causa), normalmente só o faz porque é algo que não tem nenhum custo: basta a energia de se dizer um defensor das baleias e clicar em um “compartilhar” que a pessoa já consegue pagar de bonzinho, de engajado, de “consciente”.

Causas assim não faltam, seja desde a pessoa que é contra o racismo ou a homofobia – ou que apoia ridicularidades politicamente corretas – a coisas como ambientalismo, vegetarianismo ou contra o abandono de animais. Seja como for, o resultado é o mesmo: é muito fácil se dizer defensor da causa X enquanto tudo o que se faz é dar uns cliques com o mouse. Difícil mesmo é realmente investir tempo ou dinheiro e fazer algo a respeito, como fazer uma doação, fazer um trabalho voluntário ou participar ativamente da criação de alguma organização disposta a lutar por tais fins. Parece-me que, quando o próprio bolso entra em jogo, as pessoas ficam muito menos sensíveis a qualquer tipo de causa que não atenda a seus interesses narcísicos. Só estão dispostas a defender essas causas desde que a iniciativa parta do governo, em parte talvez porque o custo de defender tais bandeiras seja menos visível graças aos impostos que pagamos em tudo.

E o que a democracia tem a ver com isso? Muita coisa. Vejo a democracia como uma versão gigante das “causas do Face”. Normalmente, a grande maioria que diz defender alguma “causa” jamais está disposta a mover um músculo ou tomar qualquer iniciativa para promove-la. Se as causas do face são como a crença no Papai Noel (de que você estará realmente ajudando simplesmente compartilhando uma foto com uma legenda “todos contra o abandono de animais” ao invés de realmente fazer algo a respeito), as “soluções” democráticas são a versão para adultos dessa mesma crença infantil.

Digo isso porque hoje em dia as pessoas parecem pensar que todas as soluções devem vir do governo ou pela via política. Isso infantiliza as pessoas e destrói o senso de responsabilidade. Esses dias, por exemplo, li um artigo que falava de um médico preocupado com a péssima qualidade nutricional da alimentação moderna, e defendia subsídios para empresas alimentícias que produzissem alimentos mais saudáveis. Oras, se ele está tão preocupado assim, por que simplesmente não cria uma organização disposta a juntar fundos para pagar por tais subsídios ou para promover as empresas que produzem alimentos mais saudáveis? Ou: por que os ambientalistas não criam uma agência disposta a arrecadar fundos para pagar por pesquisas em energia limpa ou tecnologias que reduzam a emissão de poluentes? Simples: porque é muito mais fácil e menos dispendioso simplesmente se dizer um defensor do meio ambiente e votar naqueles governantes dispostos a “investir” nessa área do que pagar com o próprio dinheiro, e então se gabar por ser "politizado" e estar "fazendo a sua parte". Desnecessário dizer que o órgão mais sensível do homem é o bolso.

O problema é que isto cria o ambiente propício para a formação de aproveitadores e grupos de pressão, que sempre vão querer a sua fatia dos impostos usados para promover qualquer tipo de causa. Oras, se o governo pode subsidiar energia limpa, por que não pode subsidiar agricultores para deixar o alimento mais barato (o que na prática significa dizer que você deve pagar mais impostos para que o açúcar fique alguns centavos mais barato) ou o resgate financeiro a empresas milionárias para evitar a demissão em massa (o que significa dizer que o empresário pode sair impune de uma péssima administração porque o prejuízo será repassado para os pagadores de impostos)? Por sinal, esta é a grande ilusão da crença nas soluções democráticas: creio que não passa de uma histeria coletiva que visa a promover causas com o dinheiro dos outros. E quando os outros são obrigados a pagar o preço e a liberdade por aquilo que você defende, não espere que a sua liberdade ou os seus direitos tenham muita garantia. Creio ser desnecessário dizer que, quando os outros são obrigados a pagar por aquilo que você defende, não espere que o espírito de iniciativa e de responsabilidade consiga ser preservado no coração das pessoas, mas nunca é demais relembrar. De fato, justamente por isso não acredito em NENHUMA solução pela via democrática.

Claro que você é livre para defender a causa que quiser, mas fica o alerta: cuidado com qualquer um que advogue pela solução democrática ou pela via política. Quando os outros são obrigados a pagar por aquilo que você quer, não se espante se eles o obrigarem a pagar por coisas que considera hediondas. O palco para a tirania já estará armado.

Rafael Andreazza é professor

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