Hoje vi uma postagem de uma briga entre duas adolescentes numa sala de aula. O que me espantou nao foi a luta ou a omissão dos presentes, mas sim sua frequente normalidade e me lembrei de um texto que escrevi sobre a atualidade do livro Laranja Mecânica e esses fatos. Esse texto é de 2014 e esta cada dia mais próxima a realidade da obra. Leiam a resenha e tirem suas conclusões.
Num domingo desses, li uma notícia que me chamou a atenção sobre formaturas de alunos do ensino médio. Falava sobre o excesso de bebidas nessas festas e a total inércia dos pais. Antes disso, já havia acompanhado o caso dos “rolezinhos” e sempre procuro acompanhar casos de brigas e atos violentos cometidos por essas crianças. O que parece ser uma novidade, aqui nestas paragens e também lá fora, na verdade já havia sido contado de forma explícita e visionária na obra Laranja Mecânica, e esse é o livro da semana, abrindo uma série de Best-Sellers que viraram clássicos na literatura e no cinema.
Uma das razões de eu ser um apreciador de distopias é o fato desse tipo de obra antecipar acontecimentos com margem de anos de diferença, porém não como profecias, mas como uma descrença no ser-humano, seus autores baseiam-se no pior da humanidade e na consequência de seus atos, esse é o caso da obra de Anthony Burgess.
Lançado no início dos anos de 1960, o livro conta (em primeira pessoa) a história de Alex, garoto de 14 anos e líder de um grupo de adolescentes arruaceiros nuns EUA distópico onde garotos dominam as ruas ao cair da noite praticando roubos, espancamentos e estupros. Ele narra suas andanças noturnas regadas a leite com drogas, até ser traído por seus comparsas e preso virando cobaia num programa de conversão de marginais.
Há dois pontos a observar na obra. O primeiro deles é a antecipação do comportamento hedonista, agressivo e ditatorial desses meninos filhos de pais permissivos que não conseguem impor limites a esses jovens. Quem pensou nos rapazes que queimaram o índio em Brasília, há anos, ou os jovens que foram para shopping centers fazer arruaça assustando clientes e sendo justificados por seus pais, não está equivocado. Os personagens parecem saídos dos jornais atuais: violentos, vaidosos, sem qualquer noção de limites ou valores.
O segundo ponto também tem relação com os novos tempos. Quando vai preso, Alex é usado como cobaia em um experimento do governo que promete acabar com o instinto mal e violento dos criminosos. Submetido a tortura e infusão de drogas em seu sangue, o rapaz passa a sentir-se mal diante de atos violentos ou libidinosos. Ele passa a não ter opção entre agir correta ou incorretamente, ele é obrigado a ser bom para não sentir dor. A questão moral da escolha, do livre-arbítrio é levantada pelo fato de que a recuperação passa não pela percepção do erro e escolha em agir diferente e sim pela obrigação de ser bom.
O que isso tem a ver com nossos tempos? Muito simples, caro leitor. A cada gesto de altruísmo midiático, a cada exposição da própria felicidade, a cada comentário superficialmente profundo em redes sociais, obriga a todos nós a sermos também bons, generosos, altruístas e felizes. Não há escolha. Todos são bons, cultos e têm vidas perfeitas. Há uma ditadura da felicidade, um bom mocismo que impõe frases de efeito e clichês que todos seguem sem questionar ou refletir. A mesma obrigação de Alex em ser bom, aparece nas hastags diárias de campanhas benevolentes criadas por agências publicitárias.
Alex se recupera. Todos nós podemos também salvar nossas crianças desse futuro sombrio que aparece na obra. As distopias servem para mostrar o quanto podemos ser ruins para nós mesmos. Quando saímos da bolha, quando não nos deixamos levar por essas imposições conseguimos escolher e educar e isso é que importa no fim: o poder da escolha e a melhor escolha que não prejudique ninguém.
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